sábado, 8 de junho de 2013

COMITÊ DA VERDADE - Nota de Repúdio


O Comitê Estadual de Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco  (CMVJ-PE),  fundado em 
2010, composto por entidades e personalidades em  torno da  luta pelo resgate histórico em Pernambuco 
e no País, bem como pela efetivação dos Direitos Humanos, vem por meio deste à público manifestar 
toda sua indignação e repúdio aos pronunciamentos do Sr. José Paulo Cavalcanti Filho, membro da 
Comissão  Nacional  da  Verdade,  com  relação  a  interpretação  que  o  mesmo  reiteradamente  tem 
manifestado sobre a Lei nº 6.683/79, comumente chamada de Lei da Anistia.

Recentemente,  o  Sr.  José  Paulo  Cavalcanti  Filho,  declarou  que:  “torturadores  devem  ser 
responsabilizados no “plano moraL”, e “que é totalmente contrário a revisão da Lei da Anistia para levar 
torturadores ao banco dos réus”. Ademais, afirmou que “o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou 
pela intocabilidade da Lei da Anistia, ao julgar representação ajuizada pela Ordem dos Advogados do 
Brasil”.

O CMVJ-PE contesta veementemente  tais declarações, pelos seguintes motivos: 

1.  No âmbito da decisão do STF em  torno da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
(ADPF) nº 153, há pendente de julgamento, recurso de Embargos Infringentes interposto pela Ordem 
dos Advogados do Brasil,  inconformada com a equivocada decisão da  interpretação da Lei da Anistia de 
1979. Neste sentido, a decisão ainda está passível de apreciação pelo STF, não cabendo aplicar o  termo 
“intocabilidade da Lei de Anistia”;

2.  O Brasil  foi condenado, no ano de 2010, pela Corte  Interamericana de Direitos Humanos da 
Organização dos Estados Americanos  (OEA), no Caso da Guerrilha do Araguaia, dentre outras questões 
a esclarecer e identificar os responsáveis pelos assassinatos e desaparecimentos forçados, ocorridos 
no âmbito da cidade e no campo, e a  rever a Lei nº 6.683/79, por  tratar-se de uma autoanistia,  forjada pelo 
Congresso Nacional maculado pelo Pacote de Abril de 1977 e seus congressistas biônicos, e não de um 
“pacto social” como  insistem determinados setores;

3.  O  STF  deve  compreender  que  crimes  de  lesa-humanidade  não  são  suscetíveis  de  serem 
anistiados,  além  de  serem  imprescritíveis.  É  desta  forma  que  a  questão  sempre  foi  tratada  pelas 
inúmeras  resoluções  da  ONU  e,  principalmente,  pelo  Costume  Internacional. A  Convenção  sobre 
Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade, de 1968, evocado pelo Sr. 
José  Paulo  Cavalcanti  Filho,  tão  simplesmente  vem  a  reafirmar  compromisso  internacional  já 
previamente estabelecido e amplamente aceito, entendimento este adotado pela Suprema Corte da 
Argentina. O Estado Brasileiro,  relembramos ao  ilustre comissionado, não assinou a  referida Convenção 
sobre Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade, de 1968, pelo fato 
atroz de ter privilegiado a tortura como prática institucionalizada contra seu próprio povo, desde o início 
do Golpe de 1964,  fato este que deve ser  levado em consideração pela Comissão Nacional da Verdade;

4.  Faz-se notar interessante que o Sr. José Paulo Cavalcanti Filho, tenha citado juntamente com as 
afirmações apresentadas acima, a que apregoa o fato de que "a lei penal não retroagirá, salvo para 
beneficiar  o  réu",  evocando  cláusula  pétrea  da Constituição  de  1988,  em  seu  celebrado  artigo  5º. 
Entretanto, o referido membro da Comissão Nacional da Verdade, simplesmente esquece que neste 
mesmo artigo, em seu  inciso XLIII, pode ser encontrado o  texto seguinte:  “a  lei considerará crimes 
inafiançáveis e  insuscetíveis de graça ou anistia a prática da  tortura  (...), por eles  respondendo os 
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.   É um absurdo querer associar a 
Constituição Federal de 1988, no ano em que são celebrados os seus 25 anos de vigência, à ordem 
NOTA DE REPÚDIOconstitucional antidemocrática e violadora dos Direitos e Garantias Fundamentais do povo brasileiro, em 
atuação aos  tempos da Ditadura;

5.   O debate sobre a Lei de Anistia não é algo fadado ao fracasso ou ao passado, haja vista que 
durante o Encontro Nacional dos Comitês de Memória, Verdade e Justiça, ocorrido, ha pouco, no Estado 
de São Paulo, com a presença da Comissão Nacional da Verdade, foi aprovada moção da Sociedade 
Civil, no sentido de apoiar  integralmente, o Projeto de Lei nº 573/2011, de  iniciativa da Deputada Federal 
Luiza Erundina, o qual da interpretação autêntica ao disposto no art.1º, §1º da Lei 6.683/79, propondo 
que  “não se  incluem entre os crimes conexos, definidos no art. 1º §1º da  lei nº 6.683/79, os crimes 
cometidos por agentes públicos, militares ou civis, contra pessoas que, de modo efetivo ou suposto, 
praticaram crimes políticos”. Desta forma, a aprovação deste projeto é realmente muito importante para 
o  efetivo  cumprimento  da  sentença  condenatória  contra  o  Estado  brasileiro,  proferida,  pela  Corte 
Interamericana de Direitos Humanos.

  O Comitê  Estadual  da Memória,  Verdade  e  Justiça  de  Pernambuco  (CMVJ-PE)  exige  uma 
posição pública da Comissão Nacional da Verdade e das demais Comissões Estaduais e Municipais, em 
atuação no País, com relação às declarações destoantes e infelizes do membro da Comissão Nacional 
da Verdade, o Sr. José Paulo Cavalcanti Filho, as quais são desrespeitosas a toda uma luta promovida 
pelos  familiares dos mortos e desaparecidos políticos,  instituições democráticas e Entidades de Direitos 
Humanos, bem como a todo o povo pernambucano, cuja cota de sacrifícios e de sangue dos seus filhos 
para deter a  fúria assassina daquele  regime  foi uma das maiores do país.
  
O CMVJ-PE continuará a  lutar pelo esclarecimento da verdade,  identificação dos  torturadores e o 
fornecimento de subsídios contundentes ao Poder Judiciário, para que no futuro não tão distante possa 
haver, a  responsabilização dos que enquanto  violadores dos Direitos Humanos atuaram durante o 
regime ditatorial brasileiro e o fim da reprodução das mentiras e leviandades históricas, que não mais 
está  encontrando  guarida  sorrateira  na  opinião  pública  na  forma  de  argumentos  falaciosos  de 
autoridade.

  PELA MEMÓRIA, VERDADE E JUSTIÇA NO BRASIL!
  PARA QUE NÃO SE ESQUEÇA, PARA QUE NUNCA MAIS ACONTEÇA!
(Comissão Executiva do Comitê Estadual da Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco: Edival
Nunes Cajá, Rodrigo Deodato, Anacleto Julião, Amparo Araújo e Marcelo Santa Cruz)
Recife, 04 de Junho de 2013.

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