Por Ayrton Maciel, especial para o Blog de Jamildo
Pernambuco entra na última semana do ano sob uma expectativa. Até quarta-feira (30), conforme prometido pelo governo, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) entrega – e o Estado divulga – o estudo sobre os custos e a saída ou saídas para a Arena PE. O ano de 2015 chega ao fim, em Pernambuco, sob uma reação e um sentimento: um “espanto” e uma incerteza. Como no cenário nacional, o espanto e a incerteza têm a ver com as prioridades políticas da gestão estadual.
A surpresa, que espanta, é o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do Estado, no terceiro trimestre do ano, que apresentou uma queda de 5,6%, na comparação com igual período de 2014, de acordo com a Agência de Planejamento e Pesquisa do Estado (Condepe/Fidem). A incerteza, que amagura, é sobre a solução que será dada à contestada Arena, um equipamento esportivo que é uma multiplicação de equívocos, construido no bojo de um projeto político planejado para ser nacional.
2015 foi o ano perdido. O ano que não termina agora. O ano perdido em uma luta que divide o País. O ano que Pernambuco também perdeu. O ano do impeachment conjunto de Paulo Câmara e Geraldo Julio, governador e prefeito do Recife, condutores políticos do projeto de governo do PSB e fiadores das gestões do ex-governador e líder socialista, Eduardo Campos.
O resultado do PIB impacta negativamente no projeto de goveno iniciado há nove anos, que vangloriou-se por sucessivos índices de crescimentos do Estado acima da média nacional – como ressaltado – por oito anos.
Parte integrante desse contexto econômico, atender às exigências da Fifa para trazer a Copa do Mundo 2014 transformou-se num dano ao erário estadual. Antecipar a obra em um ano, para a Copa das Confederações de 2013, ampliou o custo, divergências e suspeitas.
O objetivo final era fortalecer o projeto político nacional, o que acabou se transformando em dois pesos insuportáveis, um ao tesouro estadual, outro ao próprio projeto político, na medida em que contribuiu para fortalecer sua precipitação para 2014, pondo em risco tanto a sua sustentabilidade futura – a partir da morte do ex-governador Eduardo Campos – quanto as novas condições da economia do Estado.
A Arena PE e o PIB de 2015 do Estado são o impeachment administrativo de Paulo Câmara e Geraldo Julio. Paulo era o secretário de Administração e Geraldo o de Planejamento e Gestão no governo de Eduardo quando da formação do Comitê Gestor da Copa, em 2011 e da assinatura dos contratatos da Arena, e importantes auxiliares do ex-governador no momento de “boom” econômico do Estado. Geraldo, o presidente do Comitê, Paulo o vice.
Dois anos depois, o governador Eduardo Campos (PSB) passou a repetir que “era preciso vencer 2013″, antes de se pensar em 2014, obviamente referindo-se ao País, uma frase de efeito vista como visionária, mas pouco compreendida e nada provável àquela época, por não ser clara e não se saber se também valeria para o Estado. Uma previsão tolerada por partir do maior aliado dos governos Lula e Dilma, embora Eduardo e o PSB já dessem sinais de debandada desde 2012, na eleição do Recife.
À época, Pernambuco fazia a apologia das sucessivas taxas anuais de crescimento, o PIB acima da média do PIB nacional. Uma verdade relativa, considerando-se que a média inclui os indicadores tanto de Estados ricos como de Estados muito pobres e pouco significantes na geração da riqueza nacional. O alerta do então governador Eduardo se valia dos indicadores econômicos e das contas, como das dificuldades para se debelar a inflação que batia as metas. Era também o aviso de que o projeto do PSB ia de encontro e preparava-se para se descolar do projeto do PT.
O estudo do custo e de propostas de solução para a Arena PE, que será entregue esta semana a Paulo Câmara, pela FGV, pode ser um norte para o implicado labirinto em que o governo está metido. Em valores absolutos, numa projeção pelos 30 anos do contrato, o estádio sairá por quase R$ 3 bilhões, a maior parte paga pelo Estado, nas condições atuais de faturamento do equipamento esportivo. Um peso absurdo para o orçamento do Estado. O estudo pode apontar um norte, mas não encobrirá o dano já causado ao erário público e ao projeto político.
Ao se fechar 2015, a revelação do PIB negativo do Estado não surpreende, porque já se estimava, mas espanta pelo tamanho da queda: 5,6% no terceiro trimestre, quando já havia registrado a redução de 3,5% no segundo trimestre. Um ano que se encerra com a dificuldade de caixa para pagar prestadores de serviço e terceirizados, e menos vazio por não ter sido dado reajuste salarial a servidores estaduais. E com cronogramas de obras parados ou atrasados.
Terá sido culpa dos erros governo federal na economia? Culpa do veto da União à contratação de empréstimos pelo Estados? Culpa de gastos elevados nos dois governos anteriores do PSB? Na verdade, um pouco de cada e mais alguma coisa.
Polêmica desde seu início, a Arena PE está sob investigação conjunta da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Obra endossada pela Assembleia Estadual e pelos Tribunais de Contas do Estado (TCU) e da União e do Estado (TCE), a Arena é alvo da Operação Fair Play, da Polícia Federal, que apura as condições de licitação, contratuais e de construção da obra pela Construtora Odebrecht, orçada em R$ 479 milhões e que já bateu em R$ 743 milhões.
A Arena PE e o PIB são o impeachment administrativo de Paulo, de Geraldo e do modelo de gestão do PSB.
O que acontecerá, politicamente, caso o inquérito da PF acuse irregularidades e apontes responsabilidades? Caso o MPF aceite e denuncie? E caso o Judiciário acate a denúncia? Talvez, pela delicadeza da situação, o PSB esteja dividido. Talvez não caiba ao PSB uma defesa do impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT).
Inaptidão administrativa e política para governar, crime de responsabilidade por praticar pedaladas fiscais, improbidade por decretos não autorizados pelo Congresso, omissão na Petrobras, “mentir” em campanha e excesso de gastos, os erros atribuídos à presidente não têm respaldo jurídico para o impeachment. Peça política encontrada na Constituição, o impedimento não tem também base política para ser aplicado. Medidas iguais foram adotadas pelos governos anteriores.
Os erros levaram às dificuldades financeiras, à retirada de benefícios trabalhistas e sociais e a um ajuste fiscal ainda em andamento no Congresso.
No Estado como na União, as situações se assemelham. Obras estão atrasadas ou paralisadas, promessas de campanha não foram cumpridas, manobras contábeis estão salvando balanços e criam fontes de receitas emergenciais, e impostos são reajustados. Em janeiro, daqui a quatro dias, o ICMS sobre a gasolina e a telefonia móvel, o IPVA e o ICD (imposto sobre herança e doações) aumentam em Pernambuco.
Tanto aqui como lá, os argumentos de defesa são iguais e se confundem: as manobras contábeis, fiscais e administrativas são legais, as promessas foram feitas em outro cenário, os erros não são do atual mandato e as condições econômicas se deterioram a partir do cenário nacional e internacional.
Na política brasileira vale uma inventiva: “lealdade é como perna de cobra, todos sabem que não existe, mas insistem em acreditar”. Dois anos depois da previsão de Eduardo de que “era preciso (primeiro) vencer 2013″ antes de 2014, os indicadores das economias brasileira e de Pernambuco chegam negativos ao fim de 2015, com preocupações latentes para 2016. Não é o cenário que justifica o impeachment lá e cá.
Impeachment como se quer usar é golpe. Um dispositivo constitucional não pode ser usado contra um governante porque o seu governo não está bem ou é impopular. Impeachment não pode ser um dispositivo de oposição.
Há quatro anos, a maior parte do PSB trabalha na perpectiva de construir as bases do descolamento completo do PT e dos governos petistas. Disputou no primeiro e já estava na oposição no segundo turno de 2014. Pós-reeleição de Dilma, optou por uma “independência” de posições, confortável no quadro político instável e incerto do País.
Metade do PSB não deixou, porém, de se alinhar à oposição na pregação pelo impeachment da petista, enquadrando-a na LRF e atribuindo à presidente uma suposta incapacidade para administrar e dialogar. Paulo Câmara não vê base para o impedimento, mas Geraldo apedreja, sem se definir, esquecendo que aqui como lá as semelhanças se repetem. 2015 é o ano que não acabou.
Ayrton Maciel é jornalista
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